VIDA E DOUTRINA CRISTÃ

As riquezas profundas do conhecimento de Deus

“Ó profundidade das riquezas, tanto da sabedoria como do conhecimento de Deus! Quão insondáveis são os Seus juízos, e quão inescrutáveis os Seus caminhos!” — Romanos 11:33, LTT2009

POUCAS HORAS antes de Jesus ser crucificado, ele disse ao seu Pai Celestial: “E a vida eterna é esta: que te conheçam, a ti só, por único Deus verdadeiro, e a Jesus Cristo, a quem enviaste.” (João 17:3) Isso faz com que a compreensão adequada sobre Deus e Jesus seja essencial para os que estão se esforçando para ganhar a vida eterna por meio do presente que o Pai nos deu, a saber, seu Filho amado. Já que não podemos realmente ver a Deus, nosso conhecimento dele depende da revelação que ele fez de si mesmo por meio de sua Palavra. Assim, um estudo diligente das Escrituras é fundamentalmente importante para todos os que querem conhecer o verdadeiro Deus e desejam estar em harmonia com ele.

Muitos afirmam que seu ministro, pastor, ou padre têm a responsabilidade de obterem compreensão das Escrituras, para depois compartilharem com as pessoas o que acharem que elas devam saber. Isso, no entanto, não está em harmonia com as muitas declarações da Bíblia que incentivam a todos os cristãos a “estudar” e “pesquisar” a Palavra para obterem o conhecimento de Deus que é essencial para agradá-lo. (2 Tim. 2:15; João 5:39; Pro. 2:3-5) Existe também a tendência de enfatizar apenas as bênçãos que aguardam os pecadores ao pé da cruz, sem incentivar os crentes consagrados a adquirirem um conhecimento mais profundo de Deus que resulta numa compreensão mais abrangente do seu plano de salvação.

Também é importante evitar o ponto de vista daqueles que buscam obter muito conhecimento, mas cujos esforços resultam apenas numa maior compreensão intelectual. Se encararmos o conhecimento do modo apropriado, isto é, como o meio pelo qual Deus se revela e inspira nossa devoção a ele, então não daríamos ao conhecimento uma posição demasiadamente importante em nossa vida e coração. Mas se não encaramos o conhecimento dessa forma, essa busca poderia nos fazer sentir superiores aos outros. O conhecimento ficaria preso em nossa mente, e jamais chegaria ao coração.

O Novo Testamento fala das “coisas profundas de Deus”, do “leite”, do “alimento sólido”, e dos “mistérios” de Deus ao se referir a certos aspectos do nosso conhecimento dele. (1 Cor. 2:10; Heb. 5:13, 14; 1 Ped. 2:2; Col. 1:26-28; 2:2) Essas frases foram às vezes mal interpretadas, embora os que fizeram isso provavelmente foram sinceros em seus pontos de vista. É importante, então, que examinemos seu significado com mais detalhes.

A SIMPLICIDADE DO EVANGELHO

Não há nada na Bíblia sugerindo que apenas os com grande compreensão intelectual podem entender as verdades essenciais do plano de salvação de Deus, tampouco as Escrituras dizem que alguns possuem qualidades espirituais especiais que estão fora do alcance das “pessoas comuns” do povo do Senhor. Paulo nos aconselha a manter “a simplicidade que há em Cristo”, e adverte contra “seguirmos outro evangelho”. (2 Cor. 11:3; Gál. 1:6, 7) As verdades fundamentais do plano de Deus, bem como os padrões de justiça e de crescimento espiritual relacionados com isso, são os mesmos para todos os crentes consagrados. Essas são as “coisas profundas de Deus”, e são compreensíveis por todos os que foram chamados para prosseguirem “para o alvo, a fim de ganhar o prêmio do chamado celestial de Deus em Cristo Jesus.” — Fil. 3:14, NVI

Não devemos minimizar a importância de qualquer verdade contida na Palavra de Deus. As grandes verdades do amor divino, e do privilégio de desenvolver nosso caráter à semelhança do de Deus e de Cristo, são de vital importância. Os tipos e prefigurações do Antigo Testamento, quando usados para aumentar o brilho do plano de Deus, são extremamente valiosos para crescermos em conhecimento. Muitas profecias também foram colocadas na Bíblia para nossa edificação espiritual, bem como os vários marcos de tempo relacionados com o plano de salvação. Devemos fazer uso de todos esses recursos para fortalecermos nossa fé e crescermos na graça e no conhecimento. Que nenhum de nós fique desanimado, supondo erroneamente que há certas “coisas profundas” da Palavra que estão além da nossa compreensão, e que Deus quer sejam compreendidas apenas por uma minoria dentre seu povo.

Em nossa comunhão uns com os outros talvez descubramos que certos pontos de vista e detalhes da verdade que apresentamos não parecem ser geralmente compreendidos e apreciados. Em casos assim, talvez fosse prudente reavaliarmos se o que estamos dizendo é apropriado, visto que uma falta geral de compreensão pode indicar que essas questões pontuais não são essenciais para alguém ser um fiel filho de Deus. Certamente, nunca devemos concluir que o Senhor nos tem favorecido com uma compreensão especial de alguma parte de sua Palavra que esteja além da capacidade dos nossos irmãos entenderem. As grandes verdades mencionadas na Bíblia como sendo as “coisas profundas de Deus”, via de regra, são as características mais simples do plano de Deus. Isso é o que devemos esperar, uma vez que Deus é o autor do maravilhoso plano de salvação por meio do qual ele revelou seu amor. Tal é a “simplicidade que há em Cristo”.

SOMBRA DE COISAS POR VIR

Escrevendo sobre o Tabernáculo no deserto e os serviços relacionados, Paulo se refere a eles como uma “sombra” de “coisas celestiais” e de “bens futuros”. (Heb. 8:5; 10:1) Certas verdades do plano de Deus estão prefiguradas nessas “sombras”, e claramente marcadas como tal no Novo Testamento. Quando as compreendemos, somos ajudados a apreciar a beleza e a simplicidade da verdade ainda mais do que anteriormente. É possível, no entanto, ficarmos tão absorvidos em tentar determinar o significado de todas as complexidades das sombras que podemos perder de vista a finalidade das “realidades” que essas representam. Novamente, não devemos achar que precisamos saber explicar o significado de cada detalhe a respeito do Tabernáculo ou de outras sombras do Velho Testamento para compreendermos as “coisas profundas de Deus”.

Quais crentes consagrados, é possível que tenhamos um desejo especial de apreciar os aspectos cronológicos do plano de Deus, ou os detalhes das muitas profecias encontradas em Sua Palavra. Podemos gastar muito tempo e esforço para entender e explicar o significado dos intrincados detalhes de tais profecias. Embora tal estudo da Palavra de Deus seja digno de elogio, precisamos tomar cuidado para não acharmos que quem não estiver inteiramente de acordo com nossas conclusões, ou que não tenha o mesmo entusiasmo para estudar detalhes proféticos, seja alguém que não valoriza o “alimento sólido” da Bíblia.

MAIS DO QUE APENAS AMOR E DEVOÇÃO

Em contrapartida, alguns podem afirmar que as verdades devocionais é que são as “coisas profundas de Deus” e o “alimento sólido” da Palavra. De fato, “Deus é amor”, e a provisão maravilhosa que ele fez por meio de Cristo nos inspira a amá-lo e a dedicar nossas vidas ao seu serviço. (1 João 4:8-10) É essencial termos fé em Deus e nas suas promessas para vivermos uma vida de devoção, e as Escrituras nos encorajam a acrescentar à nossa fé várias outras qualidades de caráter. (2 Ped. 1:5-7) Essas verdades da Bíblia são indispensáveis, mas não necessariamente “profundas”, se consideradas apenas por si mesmas. Uma compreensão das doutrinas fundamentais do plano de Deus — a criação, a queda, o resgate, a ressurreição e a restituição, entre outras — é o que, de fato, nos permite conhecer a profundidade do amor de Deus e nos dedicar totalmente a ele.

Sem uma compreensão da base doutrinária do amor de Deus, e do nosso relacionamento com ele apoiado nessas verdades fundamentais, nossa situação seria muito parecida com a da maioria dos cristãos professos. A maioria das pessoas afirma acreditar em Jesus e amar a Deus, mas sabem muito pouco ou nada sobre o que Jesus realmente realizou, nem sobre em que se baseia o amor de Deus. Podemos dizer muitas palavras belas quando discutimos o tema do amor divino, mas essas não chegam perto da profundidade bíblica da declaração de Jesus: “Porque Deus amou o mundo de tal maneira que deu o seu Filho unigênito, para que todo aquele que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna.” (João 3:16) De modo similar, nada poderia expressar de modo mais profundo nosso apreço pelo amor de Deus do que a simples declaração: “Nós o amamos a ele porque ele nos amou primeiro.” — 1 João 4:19

“QUE EXCEDE TODO O ENTENDIMENTO”

Em um pedido belo e sincero feito em prol dos irmãos de Éfeso, Paulo orou: “Para que, segundo as riquezas da sua glória, vos conceda que sejais corroborados com poder pelo seu Espírito no homem interior; para que Cristo habite pela fé nos vossos corações; a fim de, estando arraigados e fundados em amor, poderdes perfeitamente compreender, com todos os santos, qual seja a largura, e o comprimento, e a altura, e a profundidade, e conhecer o amor de Cristo, que excede todo o entendimento, para que sejais cheios de toda a plenitude de Deus.” — Efé. 3:16-19

Não há talvez nenhuma outra passagem na Bíblia que dê uma sugestão mais definida de entendimento profundo do que essa. Paulo, entretanto, não estava escrevendo sobre alguma verdade especial que fosse tão “profunda” que ele sabia que apenas poucos seriam capazes de compreendê-la, pois ele diz que seria possível ‘compreendê-la’ junto “com todos os santos”. Em outras palavras, aquela grande verdade “que excede todo o entendimento”, em sua opinião, estaria no alcance mental de todo o povo consagrado de Deus.

A palavra grega traduzida “excede” nesse texto contém a ideia de “além do habitual”. Assim, o aspecto da verdade sobre o qual Paulo escreveu não é incompreensível, mas simplesmente além do conhecimento habitual, ou seja, algo que não é geralmente entendido. O que é esse conhecimento incomum que Paulo tinha em mente, e que, segundo ele, nos permite apreciar a “a largura, e o comprimento, e a altura, e a profundidade” do amor de Cristo? A resposta é revelada quando consideramos alguns dos versos anteriores desse capítulo.

Começando com o versículo 3, observe o modo como Paulo enfatiza a grande profundidade de entendimento com o qual o Senhor lhe tinha favorecido. Ele disse: “Foi por revelação que me foi manifestado o mistério.” (BAM) Em seguida, ele indica seu desejo de que os irmãos de Éfeso poderiam “perceber o meu entendimento sobre o mistério de Cristo”. (v. 4, KJA) Paulo explicou que esse profundo entendimento de certa parte do plano de Deus como centrado em Cristo não havia sido dado a conhecer anteriormente, mas “agora tem sido revelado pelo Espírito aos seus santos apóstolos e profetas”, de modo que poderia, então, ser transmitido a outros. — v. 5

Essa verdade vital era tão profunda e inescrutável que foi necessária uma revelação especial do Senhor para que Paulo e os outros apóstolos pudessem compreendê-la. Isso é afirmado no versículo seguinte: “Que os gentios são coerdeiros, e de um mesmo corpo, e participantes da promessa em Cristo pelo evangelho.” (v. 6) Para nós isso parece ser uma verdade simples do plano de Deus, mas Paulo a tratou como um grande mistério, o que certamente foi nos dias da Igreja Primitiva.

Ao longo dos séculos durante os quais Deus estava lidando com o seu povo típico, Israel, seus profetas fizeram promessas a respeito da vinda do Messias — Cristo e seu reino. Toda a nação de Israel recebeu a oportunidade de ser a nação messiânica, associada com Cristo no cumprimento das maravilhosas promessas de bênçãos para todo o mundo. “De todas as famílias da terra só a vós vos tenho conhecido”, o Senhor disse a Israel por meio do profeta Amós. — Amós 3:2

Com esse histórico de entendimento, deve ter sido muito difícil, especialmente para os crentes judeus na Igreja Primitiva, compreender a ideia de que os gentios podiam ser “coerdeiros” com eles, e membros “do mesmo corpo” de Cristo. Para os que se deram conta desse grande mistério, ele serviu como uma maravilhosa revelação do amor divino. Mostrou que o amor de Deus era amplo e profundo o suficiente para incluir até mesmo os gentios — nações que por séculos haviam estado fora do favor de Deus — fazendo-os herdeiros das promessas messiânicas.

Os escritos do Novo Testamento indicam plenamente que essa verdade específica foi considerada pela Igreja Primitiva como uma das “coisas [muito] profundas” de Deus. Para muitos, era difícil de entender, e Paulo tinha o desejo especial de que os irmãos em Éfeso pudessem entender claramente e perceber que isso havia sido dado como uma revelação especial para ele pelo poder do Espírito Santo. Tal tipo de conhecimento estava além da compreensão usual de judeus e gentios da época, e, no entanto, hoje é algo muito simples para aqueles em cujo coração não existe preconceito étnico. Não há nenhum filho consagrado de Deus hoje que não seja capaz de compreender esse fato tão simples do plano de Deus, e, ainda assim, as Escrituras a declaram como sendo uma verdade que ajuda a revelar as “riquezas incompreensíveis de Cristo”. — Efé. 3:8

PROFUNDIDADE DAS RIQUEZAS

Intimamente associada com essa doutrina tão profunda para a Igreja Primitiva, era a verdade adicional de que mesmo os descendentes naturais de Abraão que haviam rejeitado o Messias, e, consequentemente, foram quebrados da “oliveira” da promessa, por fim haveriam de ser restaurados ao favor divino e teriam a oportunidade de ganhar a vida. Paulo examina isso detalhadamente em Romanos 11:15-32, afirmando que Deus considerou Israel como “na incredulidade” para que pudesse ter “misericórdia” deles. Daí, Paulo acrescenta as belas palavras encontradas em nosso texto de abertura, que falam da “profundidade das riquezas” do conhecimento de Deus, e de seus “insondáveis… juízos”, ou julgamentos. — V. 33

A palavra grega traduzida “profundidade” na expressão de alegria de Paulo é a mesma que ele usou em 1 Coríntios 2:10 ao falar das “coisas profundas de Deus”. Sua referência aos “insondáveis juízos” de Deus é uma citação do Salmo 36. Essa passagem diz: “A tua benignidade, ó SENHOR, chega até os céus; a tua fidelidade, até as nuvens. A tua justiça é firme como as altas montanhas; e teus juízos, insondáveis como o fundo dos oceanos… Quão precioso é teu amor, ó Deus! À sombra das tuas asas os filhos de Adão encontram refúgio.” — Vs. 5-7, KJA

Como essas palavras maravilhosas nos asseguram da benignidade de Deus, da abundância da sua misericórdia e da justiça de seus julgamentos! Esses atributos gloriosos de nosso Deus são realmente “insondáveis” no que diz respeito a nossa capacidade de absorver a plenitude de seu significado. No entanto, Paulo cita um exemplo maravilhoso da misericórdia e dos julgamentos justos de Deus, mostrando-nos que essas qualidades amorosas de nosso Pai Celestial serão manifestadas na salvação final daqueles que rejeitaram a Cristo no seu Primeiro Advento, e que ele vai exercer sua misericórdia para com todos esses.

Essa verdade é maravilhosamente clara para os que, no presente momento, apreciam e aceitam o plano das eras de Deus, mas para muitos na Igreja Primitiva era bem “profunda”, e difícil de assimilar. Ainda hoje existem muitos cristãos professos que não conseguem aceitá-la, recusando-se a acreditar que o amor de Deus é abundante o suficiente para estender a oportunidade de salvação para os que morrem na incredulidade.

“COISAS DIFÍCEIS DE EXPLICAR”

Hebreus 5:12-14 (NVI) é um dos textos frequentemente citados usados para dar a ideia de que algumas das preciosas verdades da Bíblia são simples, enquanto outras são mais profundas e espirituais. Nesses versículos Paulo fala de “leite” e “alimento sólido”. Ele diz para os irmãos hebreus que eles não estão preparados para o “alimento sólido”, mas que “estão precisando de leite”.

Qual é a verdade a que Paulo se refere como “alimento sólido”? Isso é indicado nos versículos 10 e 11, onde se fala do sacerdócio de Melquisedeque — que Jesus, tanto como rei, quanto sacerdote, foi tipificado por Melquisedeque. “Quanto a isso, temos muito que dizer”, escreve Paulo, “coisas difíceis de explicar, porque vocês se tornaram lentos para aprender”. Ele então explica aos irmãos hebreus que eles não estavam preparados para o que ele queria dizer a respeito do sacerdócio de Melquisedeque, e que eles ainda precisavam ser ensinados de novo sobre “os princípios elementares da palavra de Deus”.

O fato de que Melquisedeque foi ao mesmo tempo sacerdote e rei, e que seu duplo cargo prefigurou a Cristo, é para nós uma verdade claramente definida. (Gên. 14:18-20; Heb. 7:1-17) Mas para as mentes dos cristãos judeus na Igreja Primitiva, isso criava uma dificuldade — não porque a ideia era complexa demais, mas porque o pensamento de que tudo o que tinha que ver com um sacerdócio havia começado e terminado com Arão estava profundamente incutido em suas mentes. Em sua formação religiosa, Melquisedeque nunca havia sido mencionado ou mesmo considerado. Para eles, isso era um “alimento sólido” de difícil digestão.

No capítulo 6 de Hebreus, Paulo, em contraste, menciona o que ele descreve como “os rudimentos da doutrina de Cristo”. (v. 1) A palavra grega traduzida como “rudimentos” significa o “começo” ou “primeiras” doutrinas de Cristo. Tais, Paulo explica, são o arrependimento, a fé, o batismo, a imposição de mãos [ser gerado por espírito], a ressurreição e o juízo eterno. (v. 2) Todas essas doutrinas, embora sejam muito importantes para a vida cristã, não criaram nenhuma dificuldade especial para a mente judaica, pois não fugiam de sua forma habitual de pensamento. A verdade é que as doutrinas como o batismo, a ressurreição e o juízo não são mais fáceis de entender do que a doutrina de Melquisedeque prefigurando a Cristo como rei e sacerdote. No entanto, para as mentes das pessoas a quem Paulo estava escrevendo, elas eram muito mais fáceis de “digerir”, assim como o leite é para uma criança.

UMA “PALAVRA DURA”

Jesus, ao falar na sinagoga de Cafarnaum, disse que somente quem ‘comesse da carne do Filho do Homem e bebesse o seu sangue’ poderia alcançar a vida eterna. Ele explicou que ele era o “pão que desceu do céu”, e disse: “minha carne verdadeiramente é comida, e o meu sangue verdadeiramente é bebida.” (João 6:53-59) Quando seus discípulos ouviram essas coisas, disseram: “Dura é essa palavra. Quem consegue ouvi-la?” (v. 60) Se entendermos que o plano de redenção de Deus é centrado em Cristo, o sentido dessas palavras do Mestre é facilmente revelado. Era simplesmente uma maneira de dizer que a sua humanidade, sua pessoa, seria sacrificada para pagar o pecado do mundo. Comer a carne e beber o sangue de Jesus era simplesmente um símbolo da necessidade que os crentes tinham de — para terem vida — aceitar o grande sacrifício dele e humildemente se submeterem à vontade de Deus conforme havia sido revelado.

No entanto, para aqueles que ouviram isso pela primeira vez, e que não tinham conhecimento do plano de Deus para ajudá-los a compreender o que o Mestre queria dizer, a ideia de comer sua carne e beber seu sangue era uma “palavra dura”. Os judeus eram, na verdade, proibidos de beber sangue, e a sugestão de que eles precisavam fazer isso para viver era demais para eles. (Lev. 3:17; 7:26, 27; 17:10, 14) Muitos deles ficaram ofendidos e “já não andavam” com Jesus. — João 6:66

OS MISTÉRIOS DO REINO

Os discípulos perguntaram a Jesus por que ele falava para o público em parábolas. Ele respondeu: “Porque a vós é dado conhecer os mistérios do reino dos céus, mas a eles não lhes é dado.” (Mat. 13:10-11) Um mistério só existe enquanto o mesmo não é entendido. Jesus prometeu que os mistérios do reino seriam esclarecidos para seus seguidores. Acreditamos que Jesus cumpriu essa promessa feita ao seu povo consagrado quando chegou o devido tempo para que cada um desses mistérios fossem revelados. Ele prometeu que quando voltasse no fim da era ele se “cingiria”, ou, seja, se vestiria para servir sua casa com o “alimento no tempo devido”. (Lucas 12:37; Mat. 24:45, NVI) Muitas e ricas são as verdades que têm sido colocadas sobre a mesa do Senhor no cumprimento dessa promessa, mas elas ainda são mistérios para aqueles a quem não foi dado entender.

Com a introdução da Era do Evangelho, havia chegado o devido tempo para se dar a conhecer as “riquezas da glória deste mistério entre os gentios, que é Cristo em vós, esperança da glória”. (Colossenses 1:27) Inicialmente, para os crentes judeus, era um mistério o conceito de que Jesus, sozinho, não era o Cristo completo, mas sim que ele era a “cabeça” de um “corpo” de muitos membros. (v. 18) No entanto, como já mencionado, o amor divino manifestado superou o conhecimento humano na ocasião em que os gentios foram aceitos como coerdeiros dos crentes judeus na esperança de glória. — Efé. 3:1-9, 19

“OS OLHOS NÃO VIRAM”

Paulo escreveu aos Coríntios: “As coisas que o olho não viu, e o ouvido não ouviu, E não subiram ao coração do homem, São as que Deus preparou para os que o amam. Mas Deus no-las revelou pelo seu Espírito; porque o Espírito penetra todas as coisas.” Paulo, em seguida, identifica-as como “as profundezas de Deus”. (1 Cor. 2: 9, 10) Parte dessa passagem é tirada de Isaías 64:4, que diz que “desde a antiguidade”, ou, segundo a Bíblia King James em inglês, “desde o princípio do mundo”, o homem não entendia as coisas que Deus tem preparado para ele. Paulo explica, no entanto, que essas “coisas profundas” relativas ao plano de Deus para a bênção do homem haviam sido agora reveladas aos seguidores de Jesus pelo Espírito Santo.

Realmente, antes “o olho não havia visto, e nem o ouvido escutado” as verdades maravilhosas sobre o plano de redenção e salvação de Deus por meio de Cristo — um plano que inclui ambos os judeus e os gentios quais associados com ele na obra de libertação — mas agora a situação havia mudado. Jesus indicou isso quando disse, prospectivamente, aos seus discípulos: “Bem-aventurados os vossos olhos, porque veem, e os vossos ouvidos, porque ouvem.” (Mat. 13:16) O Salmista escreveu: “Quão grandes são, SENHOR, as tuas obras! Mui profundos são os teus pensamentos.” (Sal. 92:5) Como nos alegramos hoje que esses pensamentos “profundos” de Deus foram revelados ao seu povo, e que podemos compreender as “obras” de seu plano, e por sua graça participar nele.

“O GENUÍNO LEITE”

O apóstolo Pedro aconselhou os irmãos de sua época: “Despojando-vos, portanto, de toda maldade e dolo, de hipocrisias e invejas e de toda sorte de maledicências, desejai ardentemente, como crianças recém-nascidas, o genuíno leite espiritual, para que, por ele, vos seja dado crescimento para salvação, se é que já tendes a experiência de que o Senhor é bondoso.” (1 Ped. 2:1-3, ARA) Paulo havia escrito anteriormente: “Irmãos, não sejais meninos no entendimento, mas sede meninos na malícia, e adultos no entendimento.” (1 Cor. 14:20) Este parece ter sido o pensamento que Pedro expressou após o conselho de Paulo: que devemos nos despojar de “toda maldade” e de outras inclinações carnais. Como “crianças recém-nascidas” — sem malícia — devemos desejar o “genuíno leite espiritual” da Palavra.

Há muito na Primeira Epístola de Pedro para indicar que aqueles a quem ele escreveu não eram meras “crianças” em Cristo, na acepção geralmente atribuída a tal expressão. Além de declaração de Paulo sobre a malícia, Pedro talvez tenha se lembrado da ilustração de Jesus, quando ele, referindo-se às crianças pequenas, disse: “Dos tais é o reino dos céus.” (Mat. 19:14) Cada discípulo de Cristo deve se esforçar para ser como uma criança em simplicidade e sinceridade. Todos esses certamente terão vontade de se nutrir com o rico alimento espiritual da Bíblia, o qual, de acordo com a ilustração das “crianças recém-nascidas”, Pedro descreve como o “genuíno leite” da Palavra.

Nesse texto, a palavra grega que é traduzida como “genuíno” significa “sem mistura” ou “não adulterado”. A pessoa que tem um coração humilde como o de uma criança, desejará se alimentar apenas da verdade pura, não adulterada. e evitará as fantasias vãs do raciocínio humano. Assim, parece que nesse texto, Pedro estava se referindo a todas as doutrinas preciosas do plano de Deus como sendo “genuíno leite”. Essa ideia não intenciona minimizar a profundidade do conhecimento de Deus, mas mostrar que os humildes como crianças que se alimentam da verdade “sem mistura”, e a assimilam devidamente, crescerão “fortalecidos no Senhor e na força do seu poder”. — Efé. 6:10

Alegramo-nos com o fato de que todas as pessoas do Senhor a quem ele deu “ouvidos que escutam” e “olhos que veem” podem compreender as verdades gloriosas da Palavra de Deus. São por meio dessas verdades que nosso Pai Celestial tem se revelado a seu povo. Há, de fato, diferentes graus de compreensão e apreciação da verdade entre os de seu povo, mas não devemos achar que isso não é normal ou possa trazer consequências negativas. Deste lado do véu, ninguém jamais terá um pleno grau de conhecimento. No entanto, cada um de nós pode, e deve, estudar com o objetivo de ser “aprovado por Deus, como obreiro que não tem de que se envergonhar, que maneja bem a palavra da verdade.” — 2 Tim. 2:15

Que privilégio é, também, compartilhar as alegrias desse maravilhoso conhecimento com outras pessoas de fé igualmente preciosa. Todos podemos ajudar uns aos outros em nosso estudo da Palavra. Independentemente de quanto tempo estamos no caminho, há pontos que podemos aprender mesmo daqueles que são novos na verdade, se mantivermos uma humildade como de criança diante de Deus e uns com os outros. Acima de tudo, olhemos sempre para o Senhor para orientação, a fim de continuarmos a crescer cada vez mais no conhecimento daquele que nos “chamou das trevas para a sua maravilhosa luz.” — 1 Ped 2:9



Associação dos Estudantes da Bíblia Aurora